quarta-feira, 23 de abril de 2014

Acreditar*

gosto de metáforas que envolvam o sol e a lua. não por misticismo, mas por serem coisas tão reais e tão superiores à nossa existência, que nos tornam, de certa forma, pequenos. se há coisa certa na vida é que o sol vai sempre lá estar a aquecer este pequeno planeta, e que a lua vai continua a rodar à nossa volta, com aquele luar cheio, cíclico, repetitivo, mas sempre impressionante. se há coisa certa na vida é que o sol nasce todos os dias. podemos não vê-lo, pode estar chuva, céu nublado, nevoeiro, uma tempestade, mas que ele está lá, está. e a única forma de o vermos sempre, é estar numa posição acima da linha das nuvens, como numa montanha alta.

ora, na vida, acontece o mesmo. existem pessoas que são sol, que nos aquecem, que nos alegram os dias, que sabemos que estão lá sempre, mesmo quando não as vemos. mas raras - únicas mesmo - são as pessoas que conseguimos ver sempre a brilhar para nós. só acontece naqueles casos extremos em que a intimidade é tanta que se vive num patamar superior, pouco entendível, pouco explicável, em que nos sentimos no topo de uma montanha. aquelas a quem dizemos 'levaste-me ao céu' - e se foi levado mesmo. aquelas a quem nos abraçamos e nos sentimos levitar. aquelas em que a conversa nunca tem fim, nunca acaba, como a linha do horizonte. aquelas pessoas em que o silêncio é apenas porque se olha o outro. e isso não tem som.

quando vivemos neste estado meio embriagado, acima das nuvens, não há mau tempo, chuva, dias cinzentos que atrapalhem. porque isso são coisas térreas, lá de baixo. mas o difícil não é chegar ao topo da montanha - em qualquer paixão repentina, num pulinho sobe-se 'ao céu'. o difícil mesmo é conseguir ficar lá em cima, dia após dia. porque as noites são mais frias. mas por isso conservam mais. porque tudo é mais silencioso quando o outro não está, mas por isso permite conhecermo-nos melhor. porque no topo da montanha a solidão é mais dura, mas também por isso se dá mais valor à companhia. quando se está cá em cima é preciso coragem e persistência para passar as noites. mas quando se sabe que o sol nasce todos os dias, tem-se o sossego e a alegria tonta de simplesmente esperar que a terra - e o destino - rodem o suficiente para nos alinhar de novo com o que é nosso.
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J.D., no blog momentos