terça-feira, 13 de outubro de 2009

Não, eu não sou dessas*

Em resposta a "Ó amiga, mas porque é que não fazes como tantas mulheres e tens um filho sozinha?", eu digo isto:
"A minha geração tem filhos por geração espontânea. O tipo de amor que nos foi transmitido, pela geração ultramarina dos nossos pais, é demasiado funcional para que não vejamos os nossos Salvadores como salvadores de nós mesmos. Namoramos, casamos, temos filhos. Podemos morrer em paz. O Eu anula-se perante o Outro, a nossa vida recebe a luz de forma diferente, porque há um Outro que nos ultrapassa. Os filhos são troféus, são escapes, são desculpas esfarrapadas para relações frustradas, para pessoas mal amadas.
Acredito piamente no amor aos filhos. De resto, acredito ser este o único tipo de amor incondicional. Amamos os nossos filhos na medida em que seremos sempre uns dos outros. E é por esta mesmíssima razão que me incomoda a forma quase displicente com que eles se mandam vir. Acho tão importante e marcante e quase desestruturante a presença de um filho na nossa vida, que me revolve as entranhas a leveza com que se pensa «vamos ter um filho».
Mas obviamente que isto sou eu. Que acho que devo estar no meu melhor para receber o meu filho. Que julgo ter essa obrigação. Porque depois não me apetece nada estar em casa e olhar para ele e pensar que há coisas que ainda não fiz, que me apetecia estar a escalar os Himalaias ou simplesmente estar nos copos com os amigos. Pior, não me apetece nada reconhecer a minha falta de maturidade e generosidade afectiva para lidar com os porquês que terá ao longo da vida dele. Preciso dar-me tempo para perceber que ele não é uma extensão de mim mesma mas uma pessoa diferente. Como preciso de lhe fazer entender que os papões não existem, mesmo que ele não queira comer a papa toda, que a mamã estará sempre lá, que devemos ser honestos e verdadeiros sobretudo com nós mesmos, que temos o dever de ajudar o próximo e, acima de tudo, gostarmos muito de estar vivos. E isso tudo não vem nos livros".
Está tudo dito ou é preciso acrescentar mais qualquer coisita, hum? Também podia dizer que não me chamo Solange F. e não sou lésbica, mas isso já roçaria o p'ra lá de óbvio, digo eu.
Obrigada Princesa Sissi. Em espanto reverente agradeço este statement profundamente iluminado.
* - por mais vontade que tivesse (tenho) de ter um filho.