«(...) tenho uma noção da finitude que faz com que sinta que cada
dia é um acontecimento maravilhoso. Não é uma interpretação forçada de um carpe
diem no abismo, não é uma noção forjada em teorias new age que têm muitas
questões a resolver com uma coisa chamada realidade. Não é uma abstracção nem
uma coisa discursiva. Não ando sempre a sentir-me nas nuvens, nem acredito em
estados contínuos de alegria/energia/esperança/coragem/o que for. Isso não
existe. Porque de vez em quando, é difícil como tudo. E por isso é que é tão
maravilhoso encontrar-se sentido ainda assim. Salvar cada um dos dias. É disso
que se trata. De uma espécie de operação de salvamento quotidiana. Nunca
adormecer com a sensação de que o dia esteve à deriva, sem que tivéssemos uma palavra
a dizer. E há sempre palavras a acrescentar. Sempre. Muitas variáveis não
dependem de nós. Muitos imponderáveis, muitos planos que podem ou não ser
levados por um vento mais ou menos tempestuoso ou por um Inverno mais ou menos
rigoroso. Mas há tanto que depende só de nós. Tanto.»
| in, coisas da mar |