segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Voltar às rotinas e agradecer

6h45. Tenho meia hora de silêncio até que a casa acordar e começar o rebuliço do regresso à escola, às correrias da manhã, aos ritmos apressados. Enquanto a água ferve para o chá que me vai acordar, enquanto tomo o duche que me desperta para a vida, vou ouvindo as vozes da minha rádio, a mesma que ligo sempre em modo automático às 6h55. Vou ouvindo bom dia, num ritmo ainda suave, em jeito de começo e recomeço.
Os manos saem com o pai antes das oito, o Martim fica comigo no mimo bom dos minutos que temos só para nós. Vamos fazendo tudo com calma, com o privilégio de poder ter esta calma para ele. Que sorte!, vou pensando enquanto o visto e o aperto entre mil beijos nas bochechas que me sabem sempre a algodão doce. Vou repetindo mentalmente uma oração de gratidão.  
Dou-lhe o pequeno-almoço, organizo algumas coisas antes de sair, deixo-o espreitar o  jake e os piratas e a levar com ele bocadinhos de aventuras para partilhar com os amigos.
Fazemos o caminho até à Creche a pé, de mão dada, com conversas sobre heróis e princípes, sapos e coisas sem nexo, pouco importa. Vou respondendo aos porquês da chuva, de ir à escola, de eu ir trabalhar, do Sal ficar em casa, e tantas outras coisas e porquês deliciosos. Olho-o de soslaio só para ter a certeza de tudo. Deste tudo que é tão simples e que me faz tão feliz. No meio de uma pergunta importante, sobre o jake e o barrica serem ou não os melhores amigos, digo-lhe «gosto tanto de ti, filho.» Recebo um sorriso. Tudo o que me basta.
Entrego-o nos braços e na calma da M., a Educadora. Invejo-a pela escolha que fez, nem sempre devidamente reconhecida, nem sempre devidamente recompensada. Invejo-a por ter escolhido vestir todo os dias um amoroso bibe azul aos quadradinhos, invejo-a por ter escolhido estar sempre rodeada de vozes pequeninas e doces, de índios e piratas, de fadas e princesas. De ouvir conversas que dariam para encher livros e livros de histórias. Por partilhar com estes meninos tantas coisas boas, acalmar-lhes os medos, devolver esperança, enche-los de amor. Tantas vezes entre gritos e choros, birras e amuos, génios e feitios, a M. e tantas outras Ms deste mundo, vai tentando contornar da melhor forma que sabe e que pode, da forma que aprendeu, da forma que a vida e a experiência a ensinaram a ser estes momentos que são os mais desafiantes. Invejo-a e admiro-a pelo amor genuíno à profissão que a escolheu.

A verdade é que fiz o caminho de regresso da Creche do Martim com este sentimento de admiração gigante e respeito enorme por quem decide cuidar, proteger, ensinar, dar colo, mimo, paciência e mundo aos filhos dos outros. Tenho em mim esta admiração gigante e um respeito enorme por Educadores, Auxiliares, Professores, Cuidadores. É preciso ser-se muito grande para estar disponível para uma missão tão nobre, tão delicada e tão importante como a que têm em mãos. E eu sou muito, muito grata a estas pessoas especiais.