gosto de pensar na vida, e nos
dias, como ciclos que se sucedem. ciclos que nos conduzem num caminho direito a
um fim, mas com alguma forma de repetição. todos os dias começam e acabam no
mesmo momento e da mesma forma. as horas, e os meses, repetem-se de 12 em 12. e
um ano tem sempre quatro estações. quatro momentos de um ciclo, que 365 dias
depois se reinicia. ou a lua, que teima em encher o céu com a sua repetição,
monótona, mas ainda assim sempre surpreendente..
nas estações, tal
como na vida, cada ciclo tem uma finalidade - e uma forma de ser vivido. o verão enche-nos
de energia, de cor na pele, de forças para o inverno rigoroso. o outono como
que prepara para a luta, em modo de aviso. o inverno consome-nos as entranhas.
dias mais escuros, mais sombrios, mais curtos. chegar à primavera é o objectivo
de cada espécie, onde já vai haver mais alimento, mais cor nos jardins, mais
luz solar. nas relações - nos amigos e nos amores - o ciclo é igual. repete-se
entre momentos quentes e próximos, e momentos mais frios e distantes.
mas aqui, ao
contrário do que seria normal, são os invernos que fazem crescer as raízes que
seguram. gostar de alguém nos verões de uma relação é fácil. naqueles momentos
em que tudo é sol e festa, em que os dias são longos e as noites de brisa
quente são intermináveis, ai é fácil ser feliz. naqueles dias em que tudo corre
bem, em que os horários se encontram, em que os amigos aparecem para jantar, em
que a musica, em shuffle, bate sempre certo com o riso. aí é mais fácil ser
feliz, aí um amor cresce, cria laços, ganha dimensão. mas não fica forte. fica
maior, mas não forte.
a força de uma relação
nasce nos outros dias, nos dias difíceis.
nos invernos rigorosos, em que o cinzento enche o céu, em que a neve traz um
silêncio sufocante. nos dias em que tudo corre mal, em que o trânsito
atrapalha, em que os amigos chateiam, e até a nossa simples imagem num espelho
nos irrita. nesses dias, estar com alguém, mesmo longe, e conseguir chegar ao
fim do dia ainda mais próximo, isso sim, faz ganhar pilares inquebráveis.
quando tudo é difícil, quando tudo é dor e aperto, mas ainda assim se mantém o
sorriso para quem se ama, quando só dizer o nome dela mantém a alma cheia.
quando tudo é peso nos ombros, mas ainda assim a vontade é do abraço que
sossega, e que, de repente, nos faz ficar leves. quando no meio do inverno é ao
amor que nos agarramos, como se fosse a maior e mais segura das rochas, aí sim,
sabemos a força das raízes que cresceram no verão. e como em todos os ciclos da
vida, sabemos que o inverno há-de sempre passar. e que a primavera é já para a
semana..
* - inspirada aqui, num lugar onde escrever é como respirar..