Depois há aqueles casais que nunca discutem. Não sei se vocês conhecem alguém assim, mas eu conheço casais que nunca discutem. Mas nunca mesmo. Está sempre tudo bem, sempre tudo perfeito, tudo certinho, gostam das mesmas coisas, têm os mesmos hobbies, os mesmos hábitos, as mesmas ideias, são tipo siameses. Entendem-se às mil maravilhas e nada lhes tira o ar imperturbável. E eu já achei, há uns belos pares de anos atrás, que isto, sim, era o supra sumo do entendimento. Achei que tinha uma relação perfeita porque nunca discutíamos, porque estava sempre tudo bem, num entendimento tão harmonioso capaz de pôr em causa a paz de um monge budista.
Se acho horrível aqueles casais que discutem em tudo quanto é lado, por tudo quando é assunto, gritam, berram, insultam-se e dão dois estalos nos filhos (alguém tem de pagar sempre pelo mau humor...), o radicalmente oposto também me faz confusão. A mesmice de hábitos, os silêncios que dizem mais que muito, a submissão a tudo e mais alguma coisa e no fim, vai-se a ver, e é tudo oco. Não há nada lá dentro. Simplesmente porque acreditam que é melhor assim, que discutir é coisa de gente sem nível (atenção, falo de conversar e discutir assuntos, não falo de insultos, berros, gritaria e peixeirada) e que o bonito é manter sempre o mesmo tom, a mesma concordância, as mesmas perguntas de retórica e o mesmo nível de pseudo-diplomacia. Mesmo que isso implique que sejam infelizes, que tenham muito para dizer mas calam sempre, que sejam pessoas completamente apagadas e sem vida.
Tenho para mim que há um dia em que estas pessoas acordam cansadas... uma da outra. Como me aconteceu, um dia.